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Propriedade compartilhada avança no Brasil

Ideal para quem voa pouco por mês, aquisição de cotas de aviões e helicópteros, apesar da falta de regulamentação específica, ganha cada vez mais adeptos no país


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Norte-americana NetJets, pioneira no modelo de venda fracionada de aeronaves, acaba de pedir 425 novos jatos, incluindo 25 modelos Challenger 605

O anúncio da maior negociação de aeronaves privadas feita na história surpreendeu o setor de aviação executiva. A NetJets, companhia de táxi-aéreo de Ohio, Estados Unidos, divulgou em junho último o pedido de 425 novos jatos para os próximos quatro anos - sendo 125 firmes e 300 opcionais. Os fabricantes escolhidos para a transação foram Bombardier e Cessna. Da empresa canadense, a encomenda inclui 75 pedidos do Challenger 300 e 25 do Challenger 605, com opções para mais outras 175 unidades. Dos americanos, são 25 encomendas firmes do Citation Latitude e 125 opcionais. O investimento pode chegar a US$ 9,6 bilhões. "Estamos muito orgulhosos por receber esse endosso da NetJets. Esse pedido é um sinal de que o panorama do segmento de jatos executivos é bastante positivo e que a demanda por produtos e serviços está alta", comemora Fabio Rebello, vice-presidente regional de vendas para a América Latina da Bombardier.

A compra bilionária evidencia não só a força da aviação executiva, apesar da crise, mas também demonstra que a propriedade compartilhada de aeronaves vem conquistando um lugar cativo no mercado. O fundador da NetJets, Richard Santulli, é precursor do conceito de compras de aeronaves por cotas, nos idos da década de 1980. Um mesmo avião com vários donos foi a solução encontrada para o alto custo despendido pela inatividade dos aparelhos que não eram usados com frequência para justificar o gasto. A companhia é pioneira na operação desse segmento e mantém até hoje a liderança mundial.

NA PROPRIEDADE COMPARTILHADA, O COTISTA TEM DIREITO A UMA QUANTIDADE DE HORAS DE VOO POR MÊS E A EMPRESA TOMA CONTA DE TODA A OPERAÇÃO

TENDÊNCIA SEM RETORNO
No Brasil, embora recente, a propriedade compartilhada ganha cada vez mais adeptos. Com os negócios aquecidos, os empresários buscam independência em relação à aviação regular para cumprir sua agenda com agilidade. Mas aeronaves envolvem uma logística onerosa. São despesas com manutenção, hangaragem, seguro, leasing e tripulantes. Segundo Ricardo Gobetti, presidente da Global Aviation, empresa de táxi-aéreo que acaba de lançar a Global Shares, braço de negócio dedicado exclusivamente à venda compartilhada de aviões e helicópteros, a propriedade fracionada é ideal para quem voa de 10 a 30 horas por mês. "O empresário tem sua própria aeronave, fracionada, sem precisar EXECUTIVAgerenciar o aparelho, lidar com questões burocráticas e arcar sozinho com os custos fixos", pondera. "Porém, se o empresário voa mais de 30 horas por mês, aí pode pensar em ter sua própria aeronave e arcar com todo o uso, pois compensa". O empresário está otimista com o potencial brasileiro em torno da aceitação da propriedade compartilhada. Com a adoção desse modelo de negócio ao criar a Global Shares, estima um crescimento de 30% da empresa.

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Novo Cessna Citation Latitude também faz parte do lote de jatos encomendado pela NetJets

O fato de o modelo ser bem-sucedido nos Estados Unidos e na Europa, e o reconhecimento de que "o mercado deseja ter o a esses bens e entende que não se justifica a propriedade exclusiva para um baixo nível de utilização", foi o que levou a criação da Prime Fraction Club, que, além de aviões, opera iates e automóveis esportivos, contando com uma frota de dez ativos. "É uma tendência sem retorno. Começa a haver a mudança cultural com a valorização do que interessa, que é a utilização e não a propriedade. Não é falta de dinheiro para os usuários de bens compartilhados, é a falta de sentido em ter muitos milhões de dólares imobilizados, além dos elevados custos mensais, considerando a pouca utilização", acredita Walterson Caravajal, diretor-presidente da Prime Fraction Club. A empresa aposta, ainda, na intermodalidade como diferencial no compartilhamento de propriedade. Na operadora, os proprietários de ativos têm o intermodal de bens. "Por exemplo, um associado de São Paulo pode voar de Congonhas (SP) para o Aeroporto de Jacarepaguá (RJ) com o jato do qual é sócio e utilizar um helicóptero de outro grupo de proprietários para visitar sua fábrica em Duque de Caxias (RJ)", esclarece Caravajal.

O empresário Rogério Andrade é um dos pioneiros na venda compartilhada de aeronaves no Brasil e na América Latina. Antes à frente da extinta Helisolutions, agora preside a Avantto. "Fizemos um aporte de US$ 120 milhões em ativos para iniciar a companhia, e mais US$ 9 milhões em novas aeronaves encomendadas para este ano. Mesmo recente, a Avantto é uma das maiores do setor, com uma frota de 47 aeronaves sob nossa gestão, sendo 23 helicópteros e 24 aviões, e uma carteira de 350 clientes", explica o empresário. Com os anos de atuação, Andrade percebe o amadurecimento por que a o mercado e a aceitação dessa modalidade crescer exponencialmente ano após ano. "No início, era difícil vender o conceito de compartilhamento para os clientes, que estavam acostumados a ter sua própria aeronave. Atualmente, o consumidor de aviação executiva ou a otimizar recursos e, principalmente, a terceirizar a dor de cabeça que é istrar aeronaves", justifica Andrade.

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AgustaWestland Power

CUSTOS POR COTAS
Na propriedade compartilhada, o cotista tem direito a uma quantidade de horas de voo por mês e a empresa toma conta de toda a operação. Na Prime Fraction Club, por exemplo, há três níveis de custo: o custo de propriedade, que representa a aquisição da fração; o custo fixo, que faz frente às despesas corriqueiras; e os custos variáveis, que cobrem gastos com combustível e provisões de manutenção, pago por cada usuário na proporção de sua utilização em horas, contado minuto a minuto. A cota única e individual do Phenom 100, limitado a três donos, custa US$ 1,266,666.00 com taxa de manutenção fixa de R$ 28.900,00 por usuário. Do Phenom 300, o valor da cota é US$ 2,910,000.00, e a taxa de manutenção custa R$ 38.400,00. Na prática, o cotista da Prime desembolsa pouco mais de 30% do preço da aeronave para adquiri-la fracionada.

"NOSSOS NEGÓCIOS DEVEM CRESCER 30% COM A VENDA FRACIONADA DE AERONAVES"


Ricardo Gobetti, presidente da Global Aviation, que acaba de lançar a Global Shares

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"O INTERESSE É MAIS PELA UTILIZAÇÃO DA AERONAVE DO QUE PELA PROPRIEDADE"


Walterson Caravajal, diretor-presidente da Prime Fraction Club

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Phenom 100

No fracionamento dos helicópteros da Prime, a cota vai desde US$ 118,000.00, valor do R44 Raven II, cuja taxa de manutenção custa R$ 6.982,00, até US$ 1,750,000.00, fração do Agusta Power A109E, com manutenção fixa de R$ 32.724,00 por mês. Os helicóptero poEXECUTIVAdem ser voados entre 20 e 25 horas mensais. Os jatos têm disponíveis 25 horas/mês a cada cotista. Na Global Shares, uma aeronave tem no máximo cinco donos e cada um pode voar até 20 horas por mês. Acima disso, é pago o valor normal de fretamento. Na Avantto, dependendo do número de cotistas, o preço fracionado oscila de 10% a 20% do valor da aeronave.

O perfil de usuário muda de uma operadora para outra. Na Prime, 70% da clientela são empresas; na Global Shares esse índice corresponde a 85%. Na Avantto, essa diferença se equilibra, sendo 57% da cartela de clientes empresas e os 43% restantes de pessoas físicas, que vão de banqueiros a celebridades. Em outras palavras, a aeronave é mais utilizada para os negócios do que para o lazer.

"O CONSUMIDOR OU A TERCEIRIZAR A DOR DE CABEÇA QUE É ISTRAR AERONAVES"


Rogério Andrade, presidente da Avantto

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Com o aquecimento econômico, a aviação executiva tem se expandido para outras regiões. Antes era fixada no eixo Rio/São Paulo, e no Centro-Oeste, com sua pujança agrícola somada à tradição aeronáutica. O empresário Ricardo Gobetti tem percebido forte movimento em Belo Horizonte (MG), na região Nordeste, no Sul e em Brasília (DF). De olho nessa expansão, a Avantto, que tem suas principais bases operacionais no Campo de Marte (SP) e em Jacarepaguá (RJ), planeja estender o serviço até Minas Gerais, Santa Catarina e Distrito Federal. Outra expansão ocorrida foi na disposição desse modelo de negócio. Anteriormente, só havia praticamente o compartilhamento de helicópteros. Hoje há uma clara adesão de modelos com asas fixas, imprescindíveis para um país continental como o Brasil. A Avantto escolheu os jatos Phenom 100 e 300, da Embraer, para iniciar a venda fracionada de jatos. Além de dois AgustaWestland Power e dois Esquilo B3, a Global Shares istra aeronaves como Cessna CJ2 e Mustang, e o Phenom 300. Em sua carteira, a Prime opera os Phenom 100 e 300, Citation Mustang e Pilatus PC-12, além dos helicópteros R44 Raven II, R66 Turbina, Esquilo AS350 B2 e A109E.

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Robinson R44

LEGISLAÇÃO PRECÁRIA
No Brasil ainda não há uma legislação específica para propriedade compartilhada de aeronaves. De acordo com a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), "essas aeronaves são registradas no nome de empresas e seguem a regulamentação vigente quanto ao registro e à manutenção. O uso dessas aeronaves é permitido desde que não haja comercialização do voo, como qualquer outra aeronave de uso privado. Essas operações entram no rol de fiscalização da Anac, com acompanhamento específico e monitorado".

Em função dessa falta de especificidade legislativa, foi preciso uma adaptação para que usuário e prestador estejam resguardados juridicamente. Cada empresa trabalha maneiras próprias de operar o negócio com segurança. Na Prime, Caravajal explica que, para cada ativo, é constituída uma empresa e os proprietários são sócios em empresas de istração de bem próprio. A operadora possui um contrato de prestação de serviços com essas empresas e as istra.

A Avantto desenvolveu uma estrutura jurídica de modo a respaldar a transação com baixos riscos que podem envolver o negócio. "Essa estrutura criada diz respeito principalmente à solidariedade dos demais cotistas em caso de problemas financeiros de um dos clientes e responsabilidade civil em caso de eventuais danos causados a terceiros", explica Andrade. Já a Global Shares utiliza a legislação de fretamento do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565), já que a Global Aviation é homologada como táxi-aéreo. Assim, acredita Gobetti, há mais sinergia e maior segurança. Para casos de acidente com cliente, existe o seguro de responsabilidade civil que protege o patrimônio e indeniza os outros cotistas.

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SEGURO E RESPONSABILIDADE CIVIL SÃO PONTOS MAIS DELICADOS A SEREM CONSIDERADOS NA HORA DE COMPRAR COTAS DE AERONAVES

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Eurocopter Colibri EC120 B

A ABAG (Associação Brasileira de Aviação Geral) defende que as autoridades aeronáuticas reconheçam o gerenciamento de aeronaves e a propriedade compartilhada como modelos de negócios, mas reconhece que o assunto é complexo. "Nem nos Estados Unidos, que promovem há mais tempo a propriedade compartilhada, a legislação é específica", diz Ricardo Nogueira, vice-presidente executivo da ABAG. "Encaminhamos para a Anac uma proposta de regulação prevendo o reconhecimento do modelo de negócio baseado no gerenciamento de aeronaves, incluindo a propriedade compartilhada, e deixando essa responsabilidade para empresas habilitadas para tal, como os táxis-aéreos".

O contrato de seguro e os termos da responsabilidade civil são os pontos mais delicados a serem considerados na hora de comprar cotas de aeronaves. Analistas ouvidos por AERO explicam que o dono precisa ter a certeza de que a tripulação, a aeronave e o voo estejam sempre em conformidade com a legislação para garantir não só a segurança da operação, mas também a cobertura do seguro. O mesmo vale para a definição de responsabilidades, no caso de incidentes ou acidentes. Por isso, dizem os analistas, o comprador deve saber em que exatamente os sócios são solidários, quais os lastros que a aeronave terá e qual é a responsabilidade de quem a gerencia.

FRETAMENTO FRACIONADO
EMPTY LEG, O COMPARTILHAMENTO DE TRECHOS VOADOS

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Consagrada em outros países e bastante recente no Brasil, o serviço empty leg é uma espécie de vertente da propriedade compartilhada. Trata-se do aproveitamento de um trecho voado, no qual uma aeronave desloca-se de um aeroporto a outro sem reserva de ageiros. Ou seja, o cliente pode comprar apenas uma parte do percurso, que é dividido com outros usuários. Essa modalidade de fretamento fracionado é própria para quem não voa muitas horas por mês, mas precisa de economia, agilidade e flexibilidade no traslado. Quem trouxe essa modalidade para o Brasil foi a Colt Aviation, empresa de táxi-aéreo que disponibiliza o serviço para dentro e fora do país. Nesse sistema, a aeronave é disponibilizada para fretamento e os principais clientes comunicados por um e-mail específico. Apenas quem autoriza previamente o envio recebe o aviso. Na empty leg, o conceito de fretamento permanece inalterado, com as mesmas coberturas de uma contratação normal desse tipo de serviço. "Como o comunicado é feito simultaneamente para todos os clientes, a reserva é garantida àquele que primeiro se manifestar", explica Alexandre Eckmann, presidente da companhia. Nesse sistema, a quilometragem mínima requerida é de 400 quilômetros para efeito de cálculo de preços. O custo de uma empty leg é, aproximadamente, 50% do valor total de um fretamento convencional. Na empty leg, o voo não tem um horário pré-fixado e pode ser, na maioria das vezes, programado em função da necessidade do ageiro. A antecedência mínima para solicitação é de duas horas. Com essa característica, o serviço proporciona flexibilidade ao ageiro para que monte sua própria rota, desde que mantida a origem e o destino da aeronave. "Uma empty leg de Brasília a São Paulo pode ser convertida para uma rota de Goiânia a Campinas, com a aeronave saindo de Brasília, ando por Goiânia e deixando os ageiros em Campinas, com ou sem escalas. Entretanto, o valor do voo levará em consideração a quilometragem total entre Brasília e São Paulo, com as escalas solicitadas pelo contratante. No caso de necessidade de pernoite, incidirão as tarifas normais praticadas e para o dia seguinte à empty leg será cobrada a quilometragem mínima de 800 quilômetros", explica Eckmann. Para o frete fracionado são disponibilizadas todas as 17 aeronaves da frota da Colt Aviation, entre elas os Learjet 31, 60, 45XR (foto) e 60XR, o Challenger 300, Citation X, Falcon 2000LX, Global Express XRS, MD 600N e os Agusta 109E Power e 109S Grand.

Donna Oliveira/ Fotos: Divulgação
Publicado em 11/07/2012, às 12h00 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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